MAR IGNÓBIL

MAR IGNÓBIL
LIVRO LANÇADO EM 2010

quinta-feira, 3 de junho de 2010

ORDEM NA FILA

D. Lia trabalhava no Posto dos Correios da Praça Sãens Pena ao fim dos anos setenta do século XX, a semana antecedia o Natal e o movimento de cartas era imenso. Hoje, com o advento do e-mail, isso não acontece mais. Cartas de amor também são menos escritas, as epístolas caíram quase em desuso. Doações para entidades filantrópicas podem ser feitas em terminais eletrônicos de bancos. O General do Exército Stanislaw Balner estava de férias, e, pela primeira vez depois de muitos anos, numa fila para postar uma quantia para um leprosário em Minas Gerais. Até hoje, depois apenas da Índia, o Brasil é o pais onde há maior taxa de incidência de hanseníase. À época chamada de lepra mesmo, doença mutiladora e sem cura, de evolução lenta. Atualmente, já existem remédios adequados para o tratamento da doença em suas fases iniciais, se descoberta antes de provocar sequelas. Voltemos ao General. Chegara enfim a hora de postar a sua doação. Ao pegar a carta, D. Lia observou que ainda estava sem selo. Educadamente, comunicou que a fila para pôr selo na carta era outra, e que o General entrara na fila errada. O militar reclamou, disse estar na fila quase uma hora, que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos estava uma bagunça. Não parava de falar, muito alterado comunicou que estava fazendo uma doação, seu tempo valia ouro, et cetera. A funcionária ouviu-o, calmamente respondeu que se o homem desejava fazer uma caridade seu maior valor talvez estivesse no esforço que fazia para exercitá-la do que no simples valor a remeter. A autoridade foi para outra fila para selar a carta. Na volta, não quis usar da prerrogativa de ser atendido logo, sem entrar na fila outra vez.
Ao ser atendido novamente, pediu para beijar a mão de D. Lia, falou-lhe sobre seu posto na hierarquia militar, que estava acostumado a dar ordens, mandar que mensageiros pagassem suas contas e resolvessem seus problemas administrativos pessoais de rua. Enfim, agradeceu-lhe pela lição de humildade.
Certas estórias de minha mãe sempre tem o dom de comover.

Um comentário:

  1. Boa noite, Fabio, sempre bom ler os textos que escreve com esmero. Parabéns pelo blog.

    bjks

    Sonia

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