tag:blogger.com,1999:blog-77101865174523506362024-02-20T12:28:10.420-08:00ALGO SEM GESSOEste blog é dos irmãos Alberto Daflon,filho e Fabio Daflon. Um livro escrito a quatro mãos que dá nome ao blog. Seguimos a concepção de que uma poesia tem três fontes: o intelecto, o gosto e o senso comum, se o intelecto busca a verdade e o senso comum a moral, o que importa ao poema é o gosto; quanto ao intelecto e ao senso moral esses podem concorrer para o maior valor do poema, mas serão no máximo coadjuvantes relativos. O que há de essência no poema é ser belo.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.comBlogger46125tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-61639176771865436972011-10-30T09:34:00.001-07:002011-10-30T09:34:12.725-07:00Um erro paralaxeO distanciamento temporal permite a nós médicos falarmos dos nossos erros. O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro chegou a publicar um livro chamado Erros médicos, com alguns casos pitorescos outros para reflexão. Creio que meu conto/causo tem essas tintas desses dois matizes.<br />
Meu primeiro emprego público foi no Batalhão de Choque da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Um primo de meu pai, Coronel Firmo Ferraz, era Diretor de Saúde da Polícia Militar do RJ. Naquela época nem conhecia a palavra nepotismo, que existe no Brasil até hoje.<br />
Um pediatra atende adulto, mas são raros os clínicos que atendem crianças. Nessa de atender oficiais e soldados daquela Organização Militar, um dia um Sargento entrou no consultório do Departamento de Saúde. <br />
Sentou-se e disse “Doutor acho que estou com problema de impotência sexual.”.<br />
“O que está acontecendo?”<br />
“Antes eu mantinha dez relações por noite, agora só consigo manter cinco.”<br />
Inexperiente, contive o riso. Fiz o exame clínico: normal. Perguntado se fazia todo o treinamento físico militar respondeu que sim.<br />
“Quantos anos o senhor tem?”<br />
“Quarenta e sete.”<br />
“Eu tenho apenas vinte e cinco. Consigo ter três relações por noite sem me cansar, o senhor está melhor do que eu.”<br />
O Sargento que chamarei de Waldir – não posso dizer o nome dele – saiu de cabeça baixa. Pedi que entrasse o próximo militar.<br />
Uma semana depois, Waldir entrou no consultório e partiu para cima daquele médico jovem para esmurrá-lo. Empurrei a mesa, ficamos cada um de um lado. Consegui virar a mesa e Waldir ficou ao fundo do consultório e saí à procura de ajuda.<br />
O Comandante do Batalhão de Choque me chamou e perguntou o que teria dito ao seu subordinado para que tivesse aquela reação violenta.<br />
“Não sei...”<br />
De noite, dormi intranquilo. Comecei a pensar de fato na possibilidade do paciente estar impotente. Diabetes Mellitus causa problemas de ereção. Era da alçada do urologista avaliar o caso, depois que eu pedisse alguns exames de sangue. No dia seguinte, conversei com o Comandante, expliquei que Waldir sentira vergonha de dizer que não estava conseguindo nada, talvez até estivesse com problemas conjugais. A prisão foi relaxada e não constou nos assentamentos da caderneta do militar. Fiz os pedidos de exame de sangue e disse que assim que estivessem prontos marcasse uma consulta com o urologista. <br />
Final alternativo: Não fiz nada disso e só compreendi o que acontecera quando já era tarde para mudar a situação.<br />
Com essa história aprendi que o modo de um paciente se comunicar pode dificultar ao médico saber o que de fato acontece. Paciente nunca fala besteira. Tudo é pertinente.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-52298587940770159982010-10-23T16:25:00.000-07:002010-10-23T16:25:12.612-07:00O quê?Canelas belas, sob redondas coxas,<br />
ou pernas ternas para bom caminho,<br />
em passos lassos, violetas roxas<br />
alguém, mas quem? Levará ao ninho<br />
<br />
onde ela esconde; mas esconde o quê?<br />
Luz que seduz, sem por a mostra,<br />
rio em mistério onde se abre ostra<br />
d’água na anágua, porque é buquê<br />
<br />
nascido e crescido (entre duas coxas),<br />
redondas, redondas para bom caminho,<br />
nos laços dos passos, das violetas roxas<br />
sem ter por que quero com carinho,<br />
<br />
com cuidado ao lado levá-la ao estuário <br />
do rio, do rio, onde se abre a ostra<br />
da luz que seduz, ao se por à mostra,<br />
pérola que rola como seixo em rio.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-4152748819571977652010-09-13T02:46:00.000-07:002010-09-13T02:47:33.451-07:00EsperançaEnquanto houver lágrimas<br />nos olhos abusados da inocência,<br />nem tudo estará perdido.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-74424329515597777242010-09-12T04:12:00.000-07:002010-09-12T04:15:02.955-07:00PerdidoDesespero cobre a tua espera<br />Esfera que gira sem andar<br />No mesmo lugar, mesmos dilemas<br /><br />Exorcizar demônios que adoçam desencontros<br />Modificar o ser em sofrimento<br />No momento é único caminho<br /><br />E combalidos de tantos desacertos<br />Estendidos na febre que consome<br />A vida que unidos percorremos<br /><br />Buscar espaço entre os espaços<br />Passo a passo com carinho<br />Hesitante caminho sem a certeza<br /><br />Busco o tempo da delicadeza<br />Que perdido no passado construído<br />Doído de atitudes mal formadas<br /> <br /> Alberto DaflonFabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-45179639261121931702010-09-03T10:54:00.000-07:002010-09-03T10:56:09.744-07:00Ventania ou Canto do jovem suicidaSe acaso a ventania me quiser levar; <br />(me deixe ir<br /><br />na manhã de inverno, na bruma da noite fria;<br /><br />(me deixe ir...<br /><br />meu corpo anda gelado como mar antártico<br /><br />para ser tragado pela ventania; me deixe ir...<br /><br />antes que a ventania traga novas caravelas;<br /><br />( me deixe ir...<br /><br />em válvulas de escape o navio fez água;<br /><br />( me deixe ir...<br /><br /><br />amor! Ah! Não tragas mais as ondas do verão<br /><br />teus braços na enseada não oferecem porto;<br /><br />num trago de cigarro virei névoa fria; e os olhares<br /><br />vis são como os punhais, que quebram todos vidros<br /><br />das vãs escotilhas e rasgam anteparas de todos<br /><br />( conveses.<br /><br />se acaso a ventania me quiser levar, me deixe ir...<br /><br /><br />mesmo se a primavera revolver o sangue<br /><br />em buganvílias hemorrágicas sobre os muros dos jardins,<br /><br />a flor continuará a ser mera ferida.<br /><br /><br />no mar não há raízes, cabelos, cicatrizes nem as ilhas<br /><br />que o oceano quis isolar dos homens e do mundo.<br /><br />se acaso a ventania me quiser levar, me deixe ir<br /><br /><br />o outono está distante e é uma angra de montanhas<br /><br />que demora e exige demais para quem deseja partir<br /><br />agora, sozinho, sem levar ninguém a nenhum<br /><br />( naufrágio.<br /><br />se acaso a ventania me quiser levar, me deixe ir<br /><br /><br />nas quatro latitudes encontrarei jazigo, me deixe ir...<br /><br /><br />Em tempo: Sidney Mattos ( meu parceiro num samba e irmão-amigo), junto com Augusto Magalhães, falecido nos anos oitenta do século xx de morte natural, um dia fizeram a música que começava com o verso Se acaso a ventania me quiser levar..., letra e música se perderam no esquecimento...Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-88556525348061126852010-09-02T20:16:00.000-07:002010-09-03T13:04:00.676-07:00Pé na roça______________________________________para Cantilde<br />Vi luz antes de agosto de 1954,<br />menino com pé na roça,<br />não fui menino de engenho,<br />fui um guri suburbano,<br />crescido no Rocha e na Tijuca;<br /><br />- mas o avô fazendeiro,<br />trazia um passado distante<br />de nascido em 1870, e de<br />ser representante do velho<br />pensamento liberal republicano -;<br /><br />roça e cidade eram meus lugares,<br />em mim os paralelepípedos<br />das ruas e as picadas dos matos<br />eram caminhos que me acompahavam,<br />como cheiro do curral e o mau<br />cheiro da merenda da escola;<br /><br />Cantilde, a negra azeviche de coque,<br />cozinhava no fogão a lenha<br />as carnes de porco, gado ou galinha,<br />e a cocção era lenta como<br />nunca era rápido o almoço resultante:<br /><br />as verduras e os legumes <br />vinham da horta quase à soleira da casa,<br />do chiqueiro tudo se aproveitava<br />do porco, e as banhas fritavam ovo.<br /><br />a couve nas mãos de Cantilde<br />eram cortadas por micrótomo,<br />e os fios da verdura lembravam<br />amontoados de algas verdes,<br />suaves e tão macias de derreter<br />na saliva, sem o esforço dos dentes.<br /><br />Meu avô morreu em 1964,<br />aos noventa e quatro anos,<br />quando contavam dois lustros<br />os tempos dos meus desenganos.<br /><br />Cantilde também viveu muito,<br />fez tanto fubá com colher de pau,<br />tanto biscoito de polvilho,<br />deu tanta prova a moleque faminto,<br />que nas refeições a relembro <br />mexendo angu quentinho na panela,<br /><br />sobre o qual meu coração se aquece,<br />alimentando a lembrança do tempo<br />feliz ao longo do casarão largo<br />da minha infância e fase pueril,<br /><br />que passaram e sempre passarão como<br />continua a passar o longo curso daquele rio,<br />ao fundo do pomar, onde se erguiam<br />as palmeiras que viram meu pai crescer,<br />que eram quatro, hoje são só três,<br />porque uma caiu antes de um agosto,<br />mas não quero me lembrar de quando<br />Cantilde passou a cozinhar nas estrelas.<br /><br />hoje já contam onze lustros o tempo<br />dos meus desenganos; sou feliz<br />porque contemplado por um sossego no peito,<br />sempre penso no futuro com um<br />olhar no passado, e se estou desenganado,<br />no desencanto encontro o canto<br />real e forte que embala minha lira.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-73277094344610598542010-08-28T20:28:00.000-07:002010-08-28T20:30:57.643-07:00Travessiaao meu irmão Alberto Daflon,filho<br /><br /><br />Enchente pós-chuva, na pulsante e ávida enchente;<br />menino, sim, era menino, e quis a travessia. <br /><br />O rio sem margens, que comia grama, era o rio<br />barrento da roça de caminho barrento, <br />onde queria entrar sem saber para ir onde.<br /><br />Os pés do primo e do irmão – o rio lambia-lhes os pés –;<br />meus pés buscavam a margem submersa; em meus pés<br />passos, com água às canelas, continuavam passos.<br /><br />Surdo aos gritos, de pare! Pare! Pare! Continuava surdo.<br /><br />Cobra, o rio me hipnotizava, como à rã hipnotiza a cobra.<br />Redemoinho, a cobra se contraía no redemoinho.<br />Submerso, caíra enroscado junto à margem do rio submerso.<br /><br />Corpo sem reação, decidida cobra me apertava o corpo.<br />Embora, no fundo, no fundo, o rio quisesse me levar embora,<br />cobra me queria morto, na fome da sua fome de cobra.<br /><br />Desenroscado o braço, levantei-o do corpo franzino enroscado.<br />Pelo punho meu irmão arrancou-me do redemoinho.<br /><br />Na enchente pós-chuva, na pulsante e ávida enchente.<br />Menino, sim, era menino; e ainda hoje é cedo para travessia.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-87519629516218061562010-08-24T03:33:00.001-07:002010-08-24T03:33:56.331-07:00Complexo de AtlasSísifo, ao deixar pedra rolar<br />para o mesmo ponto abaixo da montanha,<br />enganava a morte, e ao lar<br />volvia a recomeçar mesma sanha;<br />jamais punha a pedra sobre os ombros,<br />nem mesmo de seu peso reclamava,<br />para agüentar o mundo e seus desassombros<br />preferia mão livre para clava;<br />mas Atlas ao contrário suportava<br />nas costas todo peso deste mundo,<br />por ser gigante de uma força extraordinária.<br />Um dia, descansado, Sísifo lhe disse<br />que iria deixar pedra rolar <br />para lado diverso da montanha,<br />talvez mais belo quem sabe do que o da casa,<br />mas Atlas implorou não fizesse isso,<br />pois isso ia causar desequilíbrio<br />na ordem do planeta sob os seus ombros,<br />e o mundo cairia, viraria escombros;<br />mas Sísifo no olhar de Atlas viu engodo,<br />e súbito a pedra caiu ao outro lado,<br />para que, sem a sina, enfim o gigante<br />aceitasse seu mundo como acabado.<br />Sem mundo o gigante ficou transtornado,<br />sua ira foi imensa, mas estava só;<br />Sísifo fora embora mudara de casa,<br />mas perto estava Prometeu acorrentado;<br />que ao ver o abutre devorar seu fígado,<br />não parecia infeliz, nem resignado;<br />Atlas aproximou-se, ofereceu ajuda,<br />mas Prometeu não quis ser desacorrentado,<br />pois ao roubar o fogo tivera o castigo<br />de o mundo libertar de todo e qualquer jugo,<br />mesmo de todo seu peso ter sobre os ombros<br />de um gigante forte, porém muito burro.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-23196555499115643632010-08-22T09:22:00.001-07:002010-08-22T09:22:56.138-07:00Pára com essa mania!Cessar mania<br />é como passar fome<br />sem emagrecer;<br /><br />não posso parar<br />sem beber um uísque<br />para ter calma,<br /><br />sou viciado<br />na droga da mania<br />mas fujo dela<br /><br />só para fazer<br />tudo que faço, penso,<br />de bom e fértil;<br /><br />mas essa mania<br />um dia ainda matará<br />quem a faz viva;<br /><br />então cessará<br />na hora da passagem<br />mania de ser<br /><br />maior que ela<br />a doce mania<br />que me faz viver.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-87499843103901113332010-08-21T19:21:00.000-07:002010-08-21T19:22:19.942-07:00OÁSIStodo encantamento <br />é feitiço recorrente<br />de alvoradas puras<br /><br />prólogos de ilusões<br />do amor inconsútil <br />posto qual miragem<br /><br />causada pelas sedes<br />da dama inconstante<br />chamada de alegria<br /><br />restrita a um momento<br />menor que a hilaridade<br />do ser feliz completo;<br /><br />então desencantar-se<br />é tornar-se um poeta<br />pobre e sem metáfora<br /><br />que baterá na porta<br />mantida entreaberta<br />somente a noite escura<br /><br />do encantamento torpe<br />dos luxuriosos prazeres<br />que murcham após o gozo<br /><br />como se fossem rosa<br />da roseira arrancada<br />para fugaz surpresa<br /><br />de quem apaixonada<br />quer manter-se bem vívida<br />por estar enamorada<br /><br />do rito e da passagem<br />que leva a encantamento<br />da miragem no oásis.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-77370955117541992322010-08-21T14:30:00.001-07:002010-08-21T14:30:59.841-07:00MAGMA, o primeiro livro de poesia erótica escrito por uma brasileira: OLGA SAVARY.Biografo-me em teu corpo despindo os cascos<br />e as crinas de égua a me tornar doce,<br />Côncava, amêndoa, combustível para os vôos:<br />mel para as nossas asas, fel para o repouso.<br />Olga Savary<br /><br />Em recente entrevista a revista Marie Claire - nº 233, de agosto de 2010, com Carolina Dieckmann, na capa; Olga Savary declarou que “Quando o poeta fala de erotismo, fala porque não teve na dose que precisava. É mais falta que excesso.”<br />Poemas eróticos de Olga Savary podem ser lidos em seu site http://www.palavrarte.com/equipe/equipe_osavary_poe1.htm; são poemas ousados, mas nunca descem a mediocridade do sexo explícito e da pornografia tão comuns em 99% dos escritores amadores que, pela falta do erotismo, desfiguram os escritos eróticos como se este pudessem, de per si, satisfazer seus instintos animalescos indignos de serem registrados mesmo nos bestiários da pós-modernidade sôfrega e sem caminho.<br />Não sei escrever poemas eróticos, mas os de Olga Savary possuem a ourivesaria essencial as obras de arte, tocam a alma e o soma, excitam mais o prazer estético que a libido, não incitam ao onanismo e nem por isso são menos intensos do que qualquer tentativa vã de corromper o erotismo. Não são para serem lidos em alcovas de doentes e nem necessitam de espaço reservado para maiores de dezoito anos, posto que são alta literatura, de feminilidade ímpar e pioneira, por terem sido desde sempre os primeiros a constituírem um livro de poesia erótica no Brasil.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-19667925833842592352010-08-20T18:28:00.000-07:002010-08-20T18:29:00.912-07:00E quando anão cavalgar ornitorrincona catraca do estômago bola de pingue-pongue<br />matará albatroz, inocente onívoro, das ilhas<br />não mais isoladas pelo oceano <br />indicado para se jogar o lixo,<br />oceano Pacífico, Atlântico, Índico,<br />desarticulados do Ártico,<br />tentados a desarticular o Antártico,<br />que nunca terão a densa <br />pureza do Mar Morto.<br /><br />catraca, catraca, catraca;<br />catraca, catraca, catraca.<br /><br />que catacrese, que nada,<br />o peixe voador voa para <br />fugir do mar infectado pelo pus<br />do abscesso civilizatório.<br /><br />a bióloga cata esferovites,<br />metais e peças de plástico<br />no bucho do albatroz onívoro;<br /><br />ovíparo alimento das ratazanas,<br />em paz para comer os albatrozes,<br />na alva e nos crepúsculos e nas tardes<br />dos programas televisivos do National Geographic.<br />Inspiring people to care about the planet since 1888.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-18717620099189149382010-08-20T04:32:00.000-07:002010-08-20T04:33:14.321-07:00Hotel cinco estrelasUm dia o playboy surgiu na nossa vida. Não tinha irmãos, mas tinha uma irmã. Éramos dispersos. Mas nos reunimos sob a liderança do alemão para decidirmos o que fazer com o intruso metido a besta que dera um cascudo num colega de classe franzino. Que estória é essa de chegar aqui com essa banca toda?!... Foi mal, agora eu deixo ele me dar um soco na cara. Reunimo-nos em volta e a vítima, hesitante em relação a dar o troco, resvalou um soco na bochecha do intruja. Quero paz e amizade. Está bem. Agora éramos cinco, nós quatro e o metido a besta. Morava no Leblon, viera morar no Rocha, bairro do subúrbio carioca, por causa de problemas financeiros da família. Prazer, Hans, disse o alemão. Sou o Luciano, disse o afro-descendente com sua voz de âncora de jornal de TV. Sou o Domingos, disse o filho do português dono de boteco. Sou o autor desta crônica caros leitores e não disse nada, embora descenda de lusitanos e suíços. Então Luís propôs nos tornamos irmãos. Ok, mano, disse o Hans. Mas você precisa consertar esta calça pescando siri para ir ao Leblon, isso parece mais uma bermuda. Meu pai tem uma confecção, vai por mim, sei o que é moda. Passamos a nos reunir, menos para estudar do que para conviver. O alemão morava no bairro de Santa Tereza e o playboy tinha sua própria turma no Leblon, mas então era um sem teto naquele lugar melhor do mundo. Subimos o morro de bonde, fizemos festas na casa de Seu Hans, pai do nosso amigo, músico violoncelista da Orquestra de Câmara da Sala Cecília Meirelles, criador de guppies, gostava de cruzar os peixes ornamentais, coisas de interesse por genética. Na casa do Seu Hans, vindo para o Brasil no intervalo entre Guerras Mundiais do Século XX havia um tanque com uma pirambóia, único peixe pulmonado do Brasil. Dois pezinhos, um de cada lado do corpo preto de chouriço. Uma boca banguela. Dois olhos oligofrênicos. Balançava o rabo no fundo do tanque e depois o aquietava para o limo cair encima, antes que dobrasse como uma colher para enfiar na boca e alimentar-se. Tinha também um cachorro africano com pele de porco, uns parcos cabelos ocres na cabeça e uma mansidão sem fim. Mas o pai do alemão adoeceu, começou a urinar pedras, a eliminar pedras através da pele. Nosso amigo disse que precisava ir embora de casa porque a barra estava pesada. Mas não tinha dinheiro para pagar a inscrição no Concurso para Sargento Especialista da Aeronáutica. Estávamos então no último ano do ginásio ou primeiro grau, como é dito agora. O playboy sugeriu fazermos uma vaquinha para pagar a inscrição. Fizemos. Vida que segue. Hoje o Hans é Sub-Oficial reformado da Força Aérea Brasileira. Luís conseguiu ir morar no Leblon porque herdou de um tio ex-pracinha um apartamento no bairro que ama. Tenho cinco irmãos, todos no Rio de Janeiro, mas quando vou à urbe da minha natalidade. Fico na casa do meu compadre. De todos mencionados nunca perdi o contato com o playboy, dono de uma vídeolocadora de vasto acervo Cult – em geral assim é chamada a cultura, hodiernamente – além dos filmes comerciais de boa locação. Quando morou em Salvador fui visitá-lo de navio como médico de bordo do Contratorpedeiro Mato Grosso. Morei em Vila Isabel e, regressado ao Rio de Janeiro, o mano tinha a chave de meu apartamento. Frequentava-o para namorar a Lea em tempos de dureza nos dias de minha ausência por motivo de viagens ou plantões. Quando serviu como controlador de voo na Base Aérea de Lagoa Santa, o alemão teve um sítio perto para plantar, conforme declarou, linguiça e macarrão. Como militar foi a única vez que exerceu atividade não remunerada extra-serviço na ativa. O negrão, hoje, é engenheiro e nos reencontrou pela internet. O filho do portuga é engenheiro naval. Ontem mesmo estive na casa do meu compadre playboy para festejar o aniversário de minha afilhada Laura. Aquele lar é o único local onde tenho um hotel cinco estrelas da amizade. Lanche na padaria e, mais importante que tudo, nas calçadas a vida animada da zona sul.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-13687737118953480042010-08-19T05:30:00.000-07:002010-08-19T05:31:19.243-07:00MÃEao nutrir filho,<br />mãe é árvore que não<br />dá fruto verde.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-53268890785816978332010-08-18T09:39:00.000-07:002010-08-19T05:02:59.967-07:00Mar dizívelSe a quilha do navio deixar trilha, o mar é dizível <br />nas velas desfraldadas em tímpanos dos ventos,<br />ventanias sibilantes das alvas e crepúsculos ou tempestades,<br />(mesmo sob a hora perpendicular do sol),<br />quando os seres abissais refugiam-se em maiores profundezas.<br />E o espírito goliardesco dos marujos está atento aos riscos,<br />aos riscos que a quilha do navio abre no mar;<br />no mar que não quer a demanda do navio ao porto.<br />O mar que engole com suas línguas todos os segredos;<br />o mar que aprisiona as sereias em enseadas e pedras;<br />o mar dissimulado das calmarias e do tédio;<br />o mar que invade grutas onde há a solidão dos náufragos;<br />o mar da ilha de Tortuga mergulhada em sangue,<br />o mar das pilhagens de navios por piratas da Somália,<br />o mar onde as cicatrizes abertas pela quilha se fecham <br />na esteira de espuma da popa, onde não há lanternas,<br />mas há o convés mais largo,<br />não infenso a solidão dos marujos e ao desespero.<br />Local que só interessa ao astrolábio pela existência do leme,<br />quando o horizonte é redondo e não há terra à vista.<br />Quando no passadiço o timoneiro importa igual ao Comandante<br />e cada membro da tripulação é uma célula viva da nave de ferro.<br />De fato, sem o fiel da aguada não há água doce, <br />e a água do lastro não é potável para ser bebida.<br />Sem o Contramestre o Oficial não descansa e a maruja <br />dorme no posto, na hora errada, no mar errante dos naufrágios torpes,<br />mesmo antes de serem lançadas espias aos cabeços dos portos<br />para surtar o navio depois do aviso apitado da ramonagem,<br />que alegra as mulheres das urbes portuárias e as do cais do retorno, <br />antes que a caldeira se apague e o navio durma um sonho,<br />no sono dos marujos ratos de bordo e dos que baixam terra,<br />na hora em que a noite é lançada como tarrafa sobre o oceano.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-15754367332385458422010-08-17T05:15:00.000-07:002010-08-17T05:18:12.863-07:00Endereço certoÀs vezes o abismo ao avesso é visto após a queda<br />como montanha agreste, com floresta e alimária,<br />sem picadas ou caminhos que levem a endereço certo,<br />quem no mundo se pôs ao largo<br />por ser incapaz de um abraço;<br /><br />ou ao limite de um muro cercado<br />com cerca elétrica para evitar o choque<br />do excesso libertário bebido como dogma<br />sem que o ser tenha um amálgama;<br /><br />assim vive no zoológico até mesmo o rei leão<br />e outros felinos, que desde que haja carne<br />mostrarão pouco os caninos; exceto<br />se por preguiça insistirem no rugido;<br /><br />abençoado é um lar, com janelas<br />abertas ao sol há alegria na casa,<br />é doce, doce, a morada; be well come to home;<br />gostará de estar em casa somente quem for bom homem.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-39448834439852796352010-08-16T18:46:00.000-07:002010-08-17T04:21:27.881-07:00Corpo desuniformeTeu corpo é alostrófico,<br />gostaria alabastrino,<br />quem nasce aqui no trópico<br />engorda ou fica franzino;<br /><br />mas não faço engorda imensa<br />na hora da segunda estrofe,<br />abaixo do crânio que pensa<br />cultivo alargado tórax;<br /><br />mas a barriga afina<br />em verso hexa-silábico,<br />os lábios da menina<br />olho c’os olhos estrábicos.<br /><br />Sois cabeça tronco e membro, poemeto;<br />nada sou sem teu sentimento forte;<br />sempre cumpro as juras que prometo,<br />a incoerência não ajuda a sorte.<br /><br />No caminho sinuoso dessa estrada longa,<br />fui onde o acaso me quis levar de avião;<br />mas quem acreditar nessa farsa ou milonga<br />poderá bater com a cara lá no rés-do-chão.<br /><br />Se o corpo<br />do poema é esquisito,<br />um copo é<br />pré-requisito.<br /><br />Verás um monossílabo<br />de cinco sílabas<br />escandidas pelos lábios<br />de uma ladra;<br /><br />ou fada se souber<br />a mágica do latrocínio<br />de ao oferecer a úbere<br />me tornar bem menos cínico;<br /><br />pois peço sua atenção,<br />como pedinte a voyer,<br />que sente algum tesão<br />ao ler o poema que lê;<br /><br />claro, apenas para numa fresta<br />olhar o poema acabado;<br />em ritmo de grande festa<br />rock'n'roll, samba e xaxado.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-2467976629121185882010-08-16T18:06:00.001-07:002010-08-16T18:06:31.724-07:00Balada a la bahianaSalve, salve o tornozelo<br />que movimenta o pé,<br />se ele for contundido<br />não jogo como Pelé,<br />que se foi um grande craque,<br />hoje é marca de café.<br />Cafezinho amargoso<br />servido após canapé,<br />ainda bem nunca servido<br />lá no tempo do rapé.<br />Como morei na Bahia<br />ainda canto o afoxé,<br />um dia quase afoguei<br />na Lagoa do Abaeté,<br />e foi um Deus nos acuda<br />explicar para Maitê,<br />com ênfase de rima aguda<br />aonde eu fui me meter<br />pra chegar molhado em casa<br />com cara de muito axé!<br />Mas driblei minha mulher<br />com carinho e cafuné,<br />melhor ser homem do mundo<br />do que ser bicho-de-pé.<br />Que no solado da esposa<br />só adormece o blasé,<br />onde a mariposa voa<br />sempre há muito o que fazer;<br />faço amor com a patroa<br />porque sei andar com fé.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-47620217381751811242010-08-16T16:39:00.000-07:002010-08-16T17:13:14.670-07:00AdynatonTão fora de mim e de si<br />a ação já consumada<br />nega revisão de texto;<br />quem sabe dos não<br />poemas e da despoesia<br />são os irmãos Campos.<br />Pior que adágio musical <br />incapaz de acontecer<br />o poema se tornar poema<br />é o popular tautológico<br />que nunca diz algo adrede;<br />então caia sobre a folha<br />a bomba de mil megatons <br />na ante-véspera inadiável<br />de um silêncio absoluto<br />- para o osso esburgado<br />de que adianta o gesso?Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-85566471974990170952010-08-16T08:23:00.000-07:002010-08-16T08:24:54.802-07:00O sabiá...Fui pego de surpresa pelo amor,<br />ainda muito verde de ciúmes,<br />já sei que cada faca tem dois gumes,<br />desdenha de mulher traduz clamor.<br /><br />Então andava triste e cabisbaixo,<br />tocava meu contrabaixo em langor,<br />roufenha era a música, sou baixo,<br />mas era longilíneo meu fragor.<br /><br />Igor era alto, gordo e bem mais forte,<br />acreditei em ira em meu vigor,<br />jurei para contenda luta à morte,<br /><br />Mas ela não era séria e eu não sabia,<br />tomei logo um direto bem nos cornos,<br />restou-me ouvir cantar o sabiá...***Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-9334174468306679422010-08-16T08:15:00.000-07:002010-08-16T08:17:46.202-07:00Flor do cardoJunho, julho, agosto, floresce o cardo,<br />com folhas bicolores brancas como leite<br />na página debaixo onde coagulado <br />lembrança traz de queijo e doce de leite,<br /><br />E verdes na de cima, que emergem do talo,<br />que elevará flor amada por queijeiros, <br />na industria de usa-la por coagula-lo <br />(o leite) se arrancadas dos canteiros<br /><br />Em sua forma de tubo e cor violácea,<br />com poderosa enzima sobre a massa láctea, <br />em queijo transformada para o palato.<br /><br />Setembro, posto à mesa o queijo da Serra,<br />orgulho português, honra da lusa terra, <br />que degusto com vinho, taça junto ao prato.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-32840326864995331802010-08-15T20:12:00.001-07:002010-08-15T20:12:32.359-07:00Soneto pelo enlouquecimentoSabes? Só sei de ti intrincados labirintos<br />de heras verdes amuradas e centrípetas,<br />por onde vagam muitos anjos e capetas<br />para rirem-se do ardor dos meus instintos<br />até que louco eu me perca em circunstâncias,<br />no descaminho mais tristonho da rotina, <br />qual alienado que sequer pensa ou atina<br />que o estugar passos aumenta as distâncias,<br />mas essa dor da tua ausência é precedente,<br />não some, não alivia e só tem lenitivo<br />quando sinto tua carne possuir minha alma.<br />Paixão de entrega máscula assim pungente,<br />só posso em lealdade a tudo que estivo,<br />mas força só adianta ao toque da tua palma.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-28031623301642841972010-08-14T13:06:00.000-07:002010-08-14T13:07:49.351-07:00Agripina- Ser filho de Agripina não foi fácil,<br />envenenou marido, foi muito má.<br />Comigo se fez sexo, nunca foi dócil,<br />mãe, desde a apojadura, pior não há.<br /><br />- Cometer parricídio, Nero não vi,<br />poupei-o de tamanha aleivosia.<br />Fui consultar vidente, logo ouvi:<br />seria imperador em apostasia.<br /><br />- Eu jamais senti dó ou dei perdão,<br />contra mãe sentir ódio causa receios,<br />foi no ventre da besta a danação!...<br /><br />- Enfia tua adaga centurião,<br />enfia a haste toda entre meus seios,<br />alimentei um monstro, enfia então...Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-86114136200351783712010-08-14T12:55:00.000-07:002010-08-14T12:56:41.225-07:00mar ignóbilo mar ignoto e ignóbil<br /><br />invadiu as planícies e curvas<br /><br />que bordam teus seios<br /><br /><br />os efluentes dos terminais,<br /><br />o óleo dos barcos e navios<br /><br />não eram apenas do viajor<br /><br /><br />nem do improvável porto<br /><br />bafejado por brumas frias<br /><br />ou hálito quente de verão;<br /><br /><br />mas impurezas são bem vindas,<br /><br />amor não é depuração d’água<br /><br />das ondas espumantes da saliva.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7710186517452350636.post-85638308581886046252010-08-14T12:47:00.000-07:002010-08-14T12:48:08.143-07:00desconcentraçõesnuma osmose do alheio<br /><br />a densidade da experiência<br /><br />não se concentra no ser,<br /><br /><br />o sal do sangue precisa<br /><br />do mesmo ser aberto para as veias<br /><br />de cada universo,<br /><br /><br />ventosas não sugam<br /><br />as substâncias vitais<br /><br />mas caem de cansaço<br /><br /><br />ou pela dor da exaustão,<br /><br />como moréias mortas<br /><br />locupletas de sangue;<br /><br /><br />a inspiração ofegante<br /><br />não substitui o lobo<br /><br />pulmonar destruído pela ira.<br /><br /><br />o fato é que a boca<br /><br />do trombone precisa do sopro<br /><br />para ser grito ou música.Fabio Daflonhttp://www.blogger.com/profile/01948687871329953797noreply@blogger.com0